terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Câncer do endométrio

Câncer do Corpo do Útero (Endométrio)
GENERALIDADES

Câncer do endométrio é um dos cânceres ginecológicos mais comuns nos Estados Unidos. A incidência é de cerca de 6 % entre todos os cânceres das mulheres.

Contribui para a alta da incidência, o melhor controle do câncer do colo uterino, a maior expectativa de vida da população em geral e a possibilidade de diagnósticos mais precoces.

No Brasil, as doenças malignas do aparelho reprodutor, têm uma prevalência da ordem de 35 %. O câncer do corpo do útero compreende 11 % dessa prevalência. Tem apresentado taxas progressivas de incidência, o que lhe confere uma importância fundamental, varia conforme a região analisada do país sendo a média de 35 por 100.000 mulheres.

A relação com o câncer do colo do útero tem diminuído significativamente devido à prevenção do mesmo.Os conhecimentos da patologia, o desenvolvimento da colposcopia, diminuem em muito a prevalência do câncer do colo invasor e a mortalidade do mesmo. Assim, na década de 50, a relação era de 16 para 1; em 1960 caiu para 5:1 e, atualmente estima-se em 2:1. Por estes dados é que se verifica o porquê tal neoplasia tem importância fundamental nos países desenvolvidos.

O tipo histológico mais comum, em torno de 90 %,é o adenocarcinoma de endométrio. É um câncer altamente curável.

A detecção pelo exame de Papanicolaou não é confiável, embora estudos terem evidenciado uma correlação entre citologia cervical anormal e câncer do endométrio de alto risco, isto é, tumor de alto grau de diferenciação histológica e invasão do miométrio pelo tumor profundo. A melhor técnica seria a que pudesse obter um fragmento do tecido endometrial.


ANATOMIA




Figura 1 : Anatomia do aparelho reprodutor feminino.

O útero está situado na pélvis entre a bexiga e o reto. Está dividido estruturalmente e funcionalmente em duas partes, o corpo e o colo, separados por um leve estreitamento, chamado istmo, que é o nível do orifício interno do colo. Este por sua vez tem duas porções, a supra vaginal, próxima à bexiga e a vaginal que se projeta para a vagina.

Os principais ligamentos de sustentação do útero são:

- Ligamentos largos;

- Ligamentos redondos;

- Ligamentos útero sacros e,

- Ligamentos cardinais.

O endométrio é a camada de epitélio que reveste a cavidade e o miométrio é o músculo que compõe o corpo do útero.

A drenagem linfática do útero, por onde se dissemina o câncer e se espalham as infecções e inflamações, se faz por quatro canais principais:

- do fundo do útero;

- pelos vasos ovarianos;

- através do meso salpinge, que é o ligamento que sustenta as trompas e as mesmas;

- ao longo dos ligamentos redondos para os linfonodos femorais.


EPIDEMIOLOGIA

Não se conhece uma causa para o câncer do corpo do útero. Ele pode desenvolver-se a partir de um endométrio normal, atrófico ou hiperplásico.

Hiperplasia é definida como um aumento anormal (em volume e espessura) de endométrio proliferante que exibe graus e combinações variados de desarranjo epitelial, estratificação epitelial e atipia citológica e epitelial.

Reposição hormonal só com estrogênio aumenta consideravelmente o risco. Já o uso da progesterona opondo-se ao estrogênio , diminui o mesmo.

Há indicação de dois diferentes mecanismos para a origem do câncer do endométrio:

I - História de exposição a estrógeno sem o uso de progesterona opondo-se ao mesmo. A fonte do mesmo seria endógena (do próprio corpo) ou por administração exógena (T.R.H.). Os tumores, neste caso, começam por uma hiperplasia endometrial e progridem para câncer.

II - O carcinoma aparece espontaneamente não, claramente, relacionado à transição de hiperplasia atípica, mas originando-se de um endométrio inerte ou atrófico.

O primeiro tipo está relacionado com uma melhor diferenciação celular e um prognóstico melhor. O segundo com células mais indiferenciadas e pior prognóstico.

As hiperplasias são classificadas em:


Simples (císticas sem atipias)


Complexas (adenomatosas sem atipias)


Atípicas:


Simples (císticas com atipias)

Complexas (adenomatosas com atipias).

A importância do conhecimento desses diferentes tipos está na relação dos mesmos com a possibilidade de progressão para câncer. Assim,
TIPO DE HIPERPLASIA 
PROGRESSÃO PARA CÂNCER ( % )
SIMPLES 
1
COMPLEXA
3

ATÍPICA :

SIMPLES 

8

COMPLEXA

29



O grau de diferenciação histológica é um fator importante na história natural e na decisão de tratamento. Tumores bem diferenciados tendem a limitar sua extensão à superfície do endométrio com menor freqüência de comprometimento miometrial.

Tumores menos diferenciados a invasão miometrial tem maior chance de ocorrer.

A invasão miometrial é um forte indício de disseminação linfática e metástases à distância independente do grau de diferenciação histológica..

A disseminação para a pélvis e linfonodos peri aórtico é comum. Metástases à distância podem ocorrer e mais comumente envolvem pulmões, fígado, ossos, cérebro e vagina.

Outro fator que relaciona disseminação extra uterina e linfonodos, é o envolvimento dos espaços capilares linfáticos no exame histo patológico.

Os riscos para desenvolvimento do câncer do endométrio podem ser avaliados na tabela a seguir:

RISCOS PARA CÂNCER DO ENDOMÉTRIO
CARACTERÍSTICA 
   RISCO AUMENTADO

OBESIDADE:

         13,5 kg  

        22,5 kg  

3   X
10 X
NULIPARIDADE
2   X
MENOPAUSA TARDIA
2.4 X
MENOPAUSA COM SANGRAMENTO
4    X
DIABETES
2.8  X
HIPERTENSÃO
1.5 X
USO DE ESTROGÊNIO SEM PROGESTERONA
9.5 X
HIPERPLASIA COMPLEXA ATÍPICA 
29 X



PREVENÇÃO

O risco do câncer do endométrio parece diminuir com:

- Redução do peso corpóreo;

- Redução de exposição a estrógenos e,

- Uso de progestínicos em conjunto com estrógenos por ocasião da Terapia de Reposição Hormonal (T.R.H.).

São dados difíceis de serem comprovados desde que, estudos controlados são escassos.

Houve um estudo chamado "Intervenção Pós-menopausa com Estrógeno / Progestínicos", realizado com 600 mulheres, que ficaram em seguimento clínico laboratorial por 3 anos.

Dividindo as mulheres em 3 grupos usando:

I - Estrogênio equino conjugado (EEC) apenas diariamente,

II - EEC + Progestínico (Acetato de MedroxiProgesterona (AMP) ou Progesterona Micronizada (PM) nos primeiros 12 dias de cada 28 dias do ciclo, ou PM continuamente ).

III - Placebo (medicação sem efeito farmacológico) verificou-se que, obtendo-se biópsias do endométrio no início do estudo e anualmente ou quando clinicamente houvesse evidência de necessidade:

I - Mulheres recebendo Progestínico + EEC, a ocorrência de Hiperplasia Uterina (HU) foi igual ao observado no grupo que tomou placebo:

* Hiperplasia Simples - 27, 7 % comparada com 0,8 % ;

* Hiperplasia Adenomatosa - 22,7 % versus 0,8 % ;

* Hiperplasia Atípica - 11,8 % versus 0 % , respectivamente.

Tais dados sugerem que doses de 0,625 mg de EEC, estavam associadas ao desenvolvimento de hiperplasia endometrial que poderiam ter sido prevenidas se,associados a AMP ou PM..

O tipo de hiperplasia tem papel no desenvolvimento do câncer do endométrio.

Uma análise retrospectiva de 170 mulheres com hiperplasia endometrial durante 13 anos, evidenciou que:

I - Somente 2 % de hiperplasia endometrial sem atipia desenvolveram carcinoma.

II - 23 % das hiperplasias atípicas progrediram para câncer.

Hoje se sabe que o uso de contraceptivos orais combinados (COC - estrogênio e progesterona), diminui o risco de desenvolvimento de câncer do endométrio em cerca de 40 %. Esta diminuição foi observada até após 15 anos de interrupção do uso de COC.

Outro fator que correlaciona disseminação extra uterina e linfonodal é o envolvimento dos espaços linfáticos capilares no exame. patológico.

No estado clínico I, a cirurgia tem um papel fundamental para determinar fatores prognósticos como se vê no quadro a seguir.
GRAU DE DIFERENCIAÇÃOHISTOLÓGICA
ENVOLVIMENTO UTERINO   
DOENÇA INTRA PERITONEAL  
RISCO DE ENVOLVIMENTO LINFONODAL  
ENDOMETRIAL AUSENTE 5 %
II ou III   
1/2MIOMÉTRIO AUSENTE    5 a 9 %pélvico
4 % peri-aórtico
ALTO GRAU  
 1/2 MIOMÉTRIO PRESENTE 20 a 60 % pélvico
10 a 30 % peri-aórtico


Também, no mesmo estádio = I foram identificados 4 fatores prognósticos adversos :

* Invasão miometrial;

* Invasão vascular;

* Ausência de receptores de progesterona e;

* Identificação de 8 ou mais figuras de mitose por campos magnificados na lâmina.

Também foi observado pelo "Gynecology Oncology Group" = GOG, considerado um dos maiores grupos cooperativos para estudo de neoplasias ginecológicas nos Estados Unidos, que para pacientes sem disseminação extra uterina os fatores prognósticos determinantes foram:

- Grau histológico de malignidade III e;

- Invasão miometrial profunda.

A freqüência de recidiva aumentava muito na presença de linfonodos pélvicos comprometidos, mestástases anexiais, citologia peritoneal positiva, envolvimento dos espaços capilares, envolvimento do colo do útero e, particularmente, linfonodos peri-aórticos comprometidos.

Quando a única evidência de disseminação extra uterina é a citologia peritoneal positiva, a influência na evolução não é evidente.

A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia - FIGO - recomenda o estudo de receptores de estrogênio e progesterona estabelecidos por métodos bioquímicos ou imuno histoquímicos, nos estádios clínicos I e II, como também, estudo da expressão oncogenética, ploidia do DNA e a fração de células na fase S, para se ter uma noção prognóstica.

Classificação Celular do Câncer do Endométrio

O tipo mais comum é o adenocarcinoma endometrióide, composto por elementos epiteliais glandulares malignos. Pode aparecer uma mistura com metaplasia escamosa, ou seja, substituição do epitélio glandular pelo escamoso estratificado.

O tumor de endométrio tipo adeno escamoso, apresenta elementos do epitélio glandular e do escamoso ou pavimentoso estratificado.

Os adenocarcinomas de células claras e os serosos papilíferos, são histologicamente semelhantes aos do ovário e trompas, com a mesma característica de pior prognóstico.

Os adenocarcinomas tipo mucinosos e indiferenciados são raros.

A tabela a seguir evidencia a freqüência dos tipos de câncer do endométrio:

I - ENDOMETRIÓIDE 75 - 80 %

A - Adenocarcinoma ciliado

B - Adenocarcinoma secretório

C - Adenocarcinoma papilar ou viloglandular

D - Adenocarcinoma com diferenciação escamosa:

1 - Adenoacantoma

2 - Adenoescamoso

II - UTERINO SEROSO PAPILÍFERO 10 %

III - MUCINOSO 1 %

IV - CÉLULAS CLARAS 4 %

V - CÉLULAS ESCAMOSAS 1 %

VI - MISTA 10 %

VII - INDIFERENCIADO

ESTADIAMENTO DO CÂNCER DO ENDOMÉTRIO

Para se determinar como o câncer se apresenta é necessário uma cirurgia. Esta consiste de:

- Histerectomia total abdominal;

- Salpingectomia bilateral;

- Ooforectomia bilateral;

- Ressecção do terço superior da vagina;

- Linfadenectomia pélvica seletiva;

- Linfadenectomia peri-aórtica seletiva;

- Coleta do líquido ascítico (se presente) ou,

- Obtenção do lavado abdominal que consiste na colocação de soro fisiológico no abdome e remoção do mesmo para análise posterior citológica.

A cirurgia assume o papel terapêutico e de estadiamento.

O estadiamento a seguir foi adotado pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia como também, pelo American Joint Committee on Cancer (AJCC):


Estadio Clínico I O carcinoma está confinado ao corpo do útero. I A : tumor limitado ao endométrio
I B : invasão miometrial menor que a metade
I C : invasão miometrial maior que a metade.


Estadio Clínico I


O câncer envolve o corpo e o colo, mas não se estende para além do útero.


II A : envolvimento glandular endocervical somente
II B : invasão estromal cervical.


Estadio Clínico IIII


O carcinoma se estende para além do útero, mas está confinado à pélvis.


III A : tumor envolve a serosa do útero e/ou anexos e/ou a citologia peritoneal é positiva


III B : presença de metástases vaginais


III C : metástases para linfonodos pélvicos e/ou peri-aórticos e/ou inguinais.


Estadio Clínico IV


O câncer envolve a bexiga ou intestino ou apresenta metástases à distância.


IV A : invasão da bexiga e/ou mucosa intestinal
IV B : presença de metástases à distância incluindo linfonodos intra abdominal e/ou inguinal.


Quanto ao grau de diferenciação histológica do adenocarcinoma temos:


G1 : 5 % ou menos de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular
G2 : 6 % a 50 % de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular
G3 : mais de 50 % de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular.


TRATAMENTO DO CÂNCER DO ENDOMÉTRIO


ESTADIO CLÍNICO I


CIRÚRGICO:


Histerectomia total, salpingo ooforectomia bilateral, remoção do 1/3 superior da vagina e linfadenectomia seleliva pélvica e peri-aórtica com obtenção de lavado peritoneal ou líquido ascítico para estudo citológico.


RADIOTERAPIA :


Com exceção do Estádio Clínico IA G1, todos os outros casos devem ser submetidos ao tratamento radioterápico adjuvante que consiste na irradiação da cúpula vaginal seguida da radioterapia externa pélvica.


A incidência de complicações intestinais é de cerca de 4 %.


A constatação de linfonodos peri-aórticos comprometido, inclui essas pacientes no grupo das que devem ter a região peri-aórtica irradiada e, de acordo com algumas instituições de pesquisa, inclusas em protocolos de tratamento quimio ou hormonioterápico.


Todas as pacientes que tem contra indicação para cirurgia devem ser submetidas à radioterapia exclusiva.

ESTÁDIO CLÍNICO II

O tratamento cirúrgico é o mesmo quando não há envolvimento cervical.

Na evidência de comprometimento do colo do útero, cirurgia de WERTHEIM MEIGS deve ser pensada. A mesma consiste na histerectomia total, salpingo ooforectomia bilateral, remoção do manguito vaginal, linfadenectomia pélvica e peri-aórtica total e ressecção dos paramétrios bilateralmente.

A radioterapia é sempre indicada pós esses procedimentos.


ESTÁDIO CLÍNICO III


Quando possível realizar a cirurgia, esta deverá ser a mesma dos estádios I e II.


Na ausência de condições clínicas e/ou cirúrgicas, a radioterapia está sempre indicada.


Pacientes neste estádio são candidatas a protocolos de tratamento quimioterápicos e em alguns centros hormonioterápicos.


A quimioterapia utiliza a doxorubicina e a cisplatina.


A hormonioterapia utiliza a progesterona em altas doses na forma de acetato de medroxi progesterona.




ESTÁDIO CLÍNICO IV

O tratamento está baseado de acordo com o grau de disseminação da doença à distância.

A hormonioterapia inclui o uso de agentes progestacionais do tipo da hidroxiprogesterona, medroxiprogesterona e megestrol.

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